Ivanildo Santos Terceiro | 20 de março de 2017
Um dos maiores erros da comunicação liberal é o estranho costume de defender o estado atual das coisas como se ele representasse um mundo livre.
Explico. Há algum tempo no Facebook me deparei com uma “denúncia” de um militante de extrema-esquerda: ônibus estavam circulando com duas catracas, uma em cima da outra, objetivando impedir a prática comum de se pular o controle de quem paga ou não para utilizar o serviço de transporte.
Como sempre, a publicação do militante atacava o capitalismo, o “livre mercado”, e a propriedade privada. Três coisas que qualquer um introduzido ao ideário liberal é capaz de notar que faltam no sistema público de transportes.
Em um ambiente com capitalismo, livre mercado, e propriedade privada, pequenos empreendedores podem acumular capital, investi-lo em carros, vans, ônibus, ou qualquer outra coisa, tendo a liberdade no mercado de transportes sem o risco de sua propriedade privada ser apreendida por fiscais da prefeitura.
De fato, ao ver uma situação como esta, qualquer liberal deveria se preocupar em corretamente comunicar as causas daquele arranjo e como fazê-lo encontrar seu fim. Infelizmente, é comum que defensores da liberdade estejam mais preocupados em garantir a liberdade existente hodiernamente do que expandi-la. Preferem reagir a agir.
Um movimento que é mais reativo do que ativo está pavimentando sua completa destruição e irrelevância. Como escrevi em outra ocasião, pessoas querem soluções para os seus problemas, eventualmente preferirão tentar qualquer coisa do que permanecerem imobilizadas.
Reagir contra tentativas de mudanças danosas pode até garantir mais algum tempo de existência à aquele diminuto espaço livre que nós agarramos com tanta vontade. Todavia, apenas a ação em prol de um mundo livre nos trará um mundo livre.
A esquerda, ou a direita, não podem ganhar tão fácil dos liberais o monopólio dos descontentes questionadores do status quo. Mais do que qualquer um, somos nós que ambicionamos reformar o Brasil de cima a baixo.
Em vez da defesa irrestrita de um arranjo que só existe graças ao estado – longe dos nossos ideias, feito apenas para marcar posição -, precisamos apontar como uma empresa colocar duas catracas, uma em cima da outra, dentro de um ônibus só é possível graças ao estado.
Liberais, como disse Lord Acton, devem encarar a liberdade como o mais elevado fim político e defendê-la ansiando por aquilo que será, e não pelo que hoje é apresentado.
Um pequeno exercício de imaginação esclarecerá melhor esta posição. Por um segundo, imagine que o Chefe do Executivo resolve vender a Petrobras amanhã. O roteiro é o usual: o BNDES financiará grandes grupos nacionais que comprarão a estatal com dinheiro do estado.
Aplaudir este arranjo é torcer para que a liberdade seja totalmente desacreditada e encontre seu caminho rumo a lata de lixo da história. Liberais deveriam ser os primeiros a criticar um cenário tão claramente corporativista e gerador de privilégios. Deveriam ser os primeiros a exigir que o estado saísse por completo do setor de petróleo e que a Petrobrás fosse dividida entre seus verdadeiros donos: os pagadores de impostos.
Dado o estado atual das coisas, esta posição certamente não é pragmática. Requer coragem e causará dor de cabeça a quem defendê-la. Mas é exatamente disso que precisamos! A defesa da liberdade precisa ser viva. Precisamos de uma aventura intelectual capaz de incomodar os encastelados dentro do poder e fazê-los temer sua ruína.
Se existe algo que podemos aprender com nossos opositores, é que, nas palavras de F.A. Hayek, “ser utopista foi um ato de coragem da parte deles [socialistas], que lhes conquistou o apoio dos intelectuais e, por consequência, uma influência sobre a opinião pública que torna possível, cotidianamente, o que até pouco tempo atrás parecia ser algo totalmente remoto.”
Imóveis, os que procuram apenas reagir, rapidamente irão notar como até mesmo a sua esfera de possível defesa da liberdade se tornou impraticável. No passado, liberais sabiam que derrubar instituições centenárias, quiçá milenares, como o absolutismo, a escravidão, e o mercantilismo era impossível, e mesmo assim o fizeram, defenderam o seu fim até que sua queda simplesmente se tornou inevitável.
Para Milton Friedman esta é nossa função fundamental. Nada de defender monopólios, cartéis, e privatizações que criam novas estatais, mas desenvolver a alternativa liberal até que ela “de politicamente impossível se torne politicamente inevitável”.
Este artigo não necessariamente representa a opinião do Students For Liberty Brasil (SFLB). O SFLB tem o compromisso de ampliar as discussões sobre a liberdade, representando uma miríade de opiniões. Se você é um estudante interessado em apresentar sua perspectiva neste blog, envie um email para [email protected] e [email protected]