Um pequeno guia para Frei Caneca

Um pequeno guia para Frei Caneca

Mano Ferreira  |  16 de janeiro, 2015 

“Governe quem governar, seja nobre ou mecânico, rico ou pobre, sábio ou ignorante, da praça ou do mato, branco ou preto, pardo ou caboclo, só há um partido, que é o da liberdade civil e da felicidade do povo; e tudo o que não for isso há de ser repulsado a ferro e fogo”. – Frei Caneca.

Quem é Frei Caneca?

Joaquim da Silva Rabelo (1779-1825), também conhecido como Frei Joaquim do Amor Divino Caneca e, principalmente, Frei Caneca. Foi sacerdote católico, professor de geometria e retórica, jornalista, ativista e poeta.

Seu nome popular, Frei Caneca, é resultado de uma ressignifcação bastante avançada para a época. Acontece que, por ser filho de um vendedor ambulante de canecas, opositores começaram a lhe chamar pejorativamente com a alcunha, que ele depois veio a adotar a fim de demonstrar orgulho de suas origens.

Por que Frei Caneca é importante?

Frei Caneca foi o principal líder e mentor intelectual do movimento revolucionário que instituiu a Confederação do Equador, uma república federalista de caráter liberal fortemente influenciada pela independência dos Estados Unidos e que foi instalada no Nordeste brasileiro no início do século XIX, com poucos meses de duração.

A iniciativa sofreu grande repressão do governo imperial de D. Pedro I, que executou grande parte de seus líderes, inclusive Frei Caneca, apesar de diversos carrascos terem recusado a tarefa por conta da admiração que sentiam por ele.

Considerado na região a mente mais erudita de seu tempo, Caneca divulgava suas ideias no jornal Typhis Pernambucano, que ele mesmo editava. No jornal – mas também nos sermões na igreja e nos discursos em praça pública -, é possível perceber um íntimo diálogo de seus pensamentos com autores como John Locke, Adam Smith e Montesquieu. Nesse sentido, é possível considerá-lo o grande liberal clássico do Brasil. “Os direitos naturais, civis e políticos do homem são a liberdade, a igualdade, a segurança, a propriedade e a resistência à opressão“, escreveu.

Apesar de sacerdote católico, defendeu com firmeza a liberdade religiosa, demolindo com vigor os argumentos que atribuiam um aspecto divino ao governo monárquico, ponto que muito se assemelha à trajetória de Locke. Em pleno contexto de nascimento da imprensa no Brasil (que só começou a existir em 1808, com a chegada da família real), Caneca foi importante defensor da plena e irrestrita liberdade de expressão: “A liberdade da imprensa, ou outro qualquer meio de publicar estes sentimentos, não pode ser proibido, Suspenso nem
limitado“, defendia.

É importante ressaltar que, apesar de alguns historiadores tentarem restringir seu liberalismo ao âmbito político, Caneca foi liberal em todos os sentidos, sem excluir o aspecto econômico. Escreveu, por exemplo, que “Nenhuma pessoa pode ser privada da menor porção da sua propriedade sem seu consentimento“, abrindo exceção apenas para os impostos estritamente necessários ao funcionamento do estado.

Também deve ser ressaltada a ênfase de Caneca na defesa da abolição da escravatura, o que tornava a Confederação do Equador mais avançada até que a própria independência americana. Antecipando mais de um século o discurso do reverendo Martin Luther King Jr, Frei Caneca sentenciou: “Todos os cidadãos são admissíveis a todos os lugares, empregos e funções públicas. Os povos livres não conhecem outros motivos de preferência, senão os talentos e virtudes“.

Por fim, para a superação das distorções causadas pelo sistema de opressão vigente, Caneca defendia, sob claro pendor iluminista, que o maior de todos os investimentos públicos deveria ser a educação, tarefa a ser repartida entre o governo e a sociedade, especialmente “aos cidadãos mais sábios e eruditos“: “A instrução elementar é necessária, a todos, e a sociedade deve prestar igualmente a todos os seus membros“.

Se você puder ler apenas uma coisa:

Frei Joaquim do Amor Divino (Por Evaldo Cabral de Melo, 2001)

Obras conhecidas de Frei Caneca:

  1. Poemas (data imprecisa)
  2. Breve Compêndio de Gramática Portuguesa (data imprecisa)
  3. Tratado de Eloquência (data imprecisa)
  4. Tabuas Dinóticas do Sistema Retórico (data imprecisa)
  5. Dissertação Político-Social (1822)
  6. Orações Sacro-Apologéticas (1823)
  7. Resposta às calúnias e falsidades da Arara Pernambucana (data imprecisa)
  8. Cartas de Pitia a Damão (data imprecisa)
  9. Typhis Pernambucano (1823-1824)

*Infelizmente a obra de Frei Caneca encontra-se há muito tempo fora de catálogo. Interessados que por ventura estejam no Recife e desejam ter acesso aos textos podem entrar em contato com Mano Ferreira.

Leia mais sobre Frei Caneca:

Ficção

  • O Auto do Frade (poema de João Cabral de Melo Neto inspirado na história de Frei Caneca)
  • A morte e a morte de Frei Caneca (história em quadrinhos inspirada na história de Frei Caneca)

Historiografia

  • Frei Joaquim do Amor Divino (Por Evaldo Cabral de Melo, 2001)
  • Frei caneca: entre Marília e a pátria (Por Marco Morel, 2000)
  • Obras Políticas e Literárias (Colecionadas pelo Comendador Antonio Joaquim de Mello, Publicadas em 1869, Republicadas em 1979 e fora de catálogo desde então)
  • O Typhis Pernambucano (Publicado pelo Senado Federal em 1984 com organização de V. Chacon)

Artigos acadêmicos e jornalísticos


Pequenos Guias para Grandes Ideias é uma série educacional do do SFLB de introdução a importantes pensadores libertários. Cada post é escrito para dar aos alunos com mentes abertas, um ponto de partida para aprender com os grandes provocadores e agitadores que contribuíram para as ideias de liberdade. Este guia sobre Frei Caneca foi escrito pelo nosso colaborador pernambucano Mano Ferreira. 

Volte para o blog

Comments are closed.

X