Alexsander Abade | 16 de maio de 2017
Um professor não apenas aquele que “dá aula”. Ele é o responsável por criar um leque de possibilidades para o aluno ter um aprendizado sobre algo da melhor maneira possível. O professor é quem instiga a mente, o raciocínio, a reflexão, a crítica e faz com que o aluno consiga aprender e chegar em um ou em vários saberes de formas diferentes, utilizando métodos didáticos diversos. Diante desta oportunidade o aluno aumenta o tamanho de sua bagagem de conhecimento, criando a possiblidade de ele aplicar o que foi conquistado em inúmeras outras áreas, seja acadêmica, empreendedora, socialmente e outras.
O papel de um professor no ambiente escolar não fica apenas dentro deste ambiente, ele é extrapolado para todos meios possíveis de se imaginar. Ao ensinar um aluno, o professor está fazendo com que este ensinamento seja compartilhado com mais dezenas, centenas e milhares de pessoas. Isto acontece porque o conhecimento é compartilhado e o convívio social proporciona este tipo de acontecimento através da interação.
Se em um belo dia um aluno aprender com o auxílio do professor, por exemplo, que língua é poder e que a linguagem, por mais complexa que ela seja, é primordial para a constituição do ser humano, que, com ela, ele pode fazer diversas leituras de mundo e de pessoas e ainda conseguir diversas conquistas e poder – sendo que este mesmo poder que ele pode ser utilizado contra ele por outras pessoas para submetê-lo a algo, acovarda-lo-, enganá-lo e doutrina-lo por meio do discurso -, este conhecimento adquirido e (re)construído por ele pode ser repassado para um grupo de amigos, que vão fazer a (re)construção de sentido da informação obtida e podem muito bem repassá-lo para um outro grupo de amigos ou família. Assim, esta rede de aprendizado sobre a importância da língua e o poder que ela possui é compartilhado alcançando um número cada vez maior de pessoas.
O exemplo demonstrado acima é usa apenas um único aluno e um único professor. Se o alcance com um aluno é enorme, imagine, então, com uma sala de vinte, trinta ou cinquenta estudantes que tiveram a oportunidade de aprender os ensinamentos sobre língua e poder que o professor ensinou em sala de aula? Ou então dez salas com cinquenta alunos da qual o professor já repassou os mesmos conhecimentos? Ou ainda uma cidade inteira com centenas de escolas, centenas de professores e milhares de alunos?
Esta rede de conhecimento se expande ainda mais, para milhões e milhões de pessoas submetidos a este sistema de ensino. A importância que uma simples aula pode ter é grandiosa, e os saberes e a dimensão que se pode atingir são enormes.
Consequentemente, a responsabilidade do professor também aumenta. Dado a extensão da área que se pode ter com a troca de saberes – que formula uma rede de conhecimento -, só por conta do ato de ensinar de um único professor, o compromisso que o docente possui é extremo para com os seus alunos, a instituição de ensino em que ele atua e como para uma camada de pessoas que direta ou indiretamente estarão envolvidas e irão interagir com os alunos que este professor tiver ministrado as aulas e partilhado saberes, ou seja, a sociedade em que eles estão inseridos.
Falo aqui, sim, de responsabilidade social. Como já exposto, o papel do professor é estimular o pensamento, a reflexão, o raciocínio, o senso crítico do aluno e fazer com que ele construa seus saberes para que os utilize posteriormente – e esta é uma responsabilidade grande e de peso considerável. Se termos em conta o período desde o ingresso de um aluno no ensino infantil até a saída dele no ensino médio, chegaremos à conclusão de que ele fica entre quinze e dezessete anos dentro do sistema educacional obrigatório. São uma década e meia ou mais no qual o aluno, em toda esta jornada, teve contato com vários professores com métodos didáticos e com construção e reconstrução de conhecimentos diferentes, o que pode ser um problema ao analisarmos o sistema de ensino brasileiro, as instituições e os docentes que, em sua grande parte, apresentam falhas e ineficiência, fazendo com que este sistema seja o mais propício para fracassar.
Algumas pesquisas realizadas comprovam as afirmações acima, como a do Indicador de Analfabetismo Funcional, realizada pela organização não-governamental Ação Educativa e a Instituição Paulo Montenegro, que apontam que 22% dos estudantes do ensino superior possuem um alfabetismo considerado “proficiente”, enquanto 74% ficam em um nível elementar e intermediário. A pesquisa ainda nos mostra que, no ensino fundamental (1 e 2) e médio, menos de 15% das pessoas saem sem possuir um nível de alfabetismo proficiente, como mostra a tabela abaixo:
Outros dados importantes, são os da recente avaliação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e de seu Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), que mostrou que o Brasil caiu mais ainda nos rankings de ciências, matemática e leitura, ficando abaixo da média mundial (mesmo com o aumento dos gastos no ensino). Além destes números ruins, há um outro fator que torna esta bola de neve tendenciosa ao fracasso ainda maior: a doutrinação ideológica compulsória dentro das salas de aula:
“Em um livro didático da disciplina de educação física utilizado no ensino médio do estado do Paraná, há um texto com o título de ‘Faço Esporte Ou Sou Usado Pelo Esporte?’, escrito por um professor chamado Gilson José Caetano. No texto, Gilson utiliza de um discurso típico marxista para afirmar, de maneira totalmente errônea, imparcial e não profissional, sobre o sistema capitalista, criticando o consumismo e escrevendo que o sistema utiliza a mídia e o esporte para manipular os jovens e as grandes massas para impor suas ideias a força na cabeça das pessoas. (…) Em declaração, o professor diz que seus recortes nos livros são, obviamente, de acordo com a concepção crítica de Karl Marx e afirma que ‘o marxismo seria a base teórica de consenso entre os professores que criaram as diretrizes da Secretaria de Educação do Paraná’. Em diversos outros textos pela internet, há de se encontrar algum texto do então professor disseminador de seus ideais, Gilson, que está ou não em livros didáticos, como este em que ele relaciona os problemas de saúde das pessoas e os seus novos ‘estilos de vida’, que consiste na rotina de trabalho dentro de um sistema capitalista.” (Alexsander Abade, em artigo: “A Educação Brasileira: Uma Falência Ministrada Por Burocratas”)
Vale lembrar que a doutrinação ideológica em si não é um problema. Um aluno ou o seu responsável pode optar em obter a doutrinação que mais lhe convém em ter para si ou para o filho, seja ela religiosa ou político-partidária. A principal problemática é a doutrinação ser feita em um ambiente que não é para ser realizada, como em escolas de rede pública e privadas das quais não possuem, na Base Nacional Comum Regular, diretrizes e disciplinas que contenham este tipo de doutrinação ideológica no currículo que dão licença para professores fazerem uma determinada doutrinação sem o total consentimento dos alunos, dos pais destes alunos e da instituição de ensino.
Tanto no trecho do artigo exposto acima como neste em questão, não afirmo que as ideias de cunho esquerdistas e marxistas devem ser proibidas ou que professores ou qualquer pessoa não deva apoiá-las e segui-las (afinal, todo discurso carrega em si uma ideologia). Minha objeção é a de que o professor – que possui tanto poder e responsabilidade – utilize de sua influência para manipular ideologicamente os alunos que, na condição que estão, podem ser vistos como estando em um patamar “inferior” e “frágil” intelectualmente em relação ao professor por este deter um conhecimento que eles, os alunos, não têm, os deixando subordinados ao saber “superior” do docente.
Podemos considerar esta atitude de doutrinação ideológica compulsória, mesmo a das mais rasas (só que muito bem-intencionadas), como uma ação indecorosa e desrespeitosa que vai contra os princípios éticos da relação humana e da docência. Um professor utilizar sua posição de poder para manipular o modo de pensar de alunos que estão em um processo de construção de conhecimento em favor à uma ideologia político-partidária da qual ele segue, não deve ser considerado como um professor, e sim como um corrupto da pior espécie.
Em contraponto com o que acabou de ser exposto, estamos vendo cada vez mais o movimento liberal e libertário crescer de uma maneira como jamais vista nos últimos cinco anos. Alguns fatos que comprovam isto são partidos políticos surgindo com ideias liberais (NOVO), candidatos com ideias e propostas liberais sendo eleitos nas últimas eleições (como Marcel van Hattem, Bruno Souza e Felipe Zortéa Camozzato), o crescente aumento no número de inscrição para novos coordenadores da organização estudantil Students For Liberty Brasil e o quanto que a esquerda está perdendo o espaço, o debate e a influência em todos os lugares (Internet, manifestações sociais, centros acadêmicos e outros).
A tendência é que estas ideias cresçam e se espalhem cada vez mais dado a grande demanda de liberdade que, finalmente, as pessoas estão procurando. Consequentemente com o aumento delas, mais profissionais que possuem este viés aparecerão, inclusive docentes – e isto já vem acontecendo. E é aqui, então, que chegamos a questão motivadora deste texto: qual será e é o papel dos professores liberais e libertários dentro do ambiente escolar que, hoje, é cercado por ideias contrárias às deles?
Em grande parte, liberais e libertários sabem que uma economia livre do estado é mais eficaz do que um controle e uma intervenção estatal. Eles possuem a convicção que as ideias esquerdistas e estatistas são ruins e sempre estão dispostos a combatê-las. Além disto, sabem também que, em um livre mercado ou mesmo em um mercado com algum nível de intervenção estatal, quanto mais você for qualificado e especializado for seu trabalho, maior será o valor da sua mão de obra. Isto se dá por você ser capaz de realizar e oferecer algo que muitos não conseguem ou fazem pior, estabelecendo um valor maior sobre o seu trabalho em relação aos outros.
Docentes não fogem à esta regra: um professor que apenas possui uma licenciatura e atua no ensino médio não possui o mesmo valor de um professor que, além da licenciatura, possui um mestrado e/ou um doutorado, que publicou artigos e livros sobre a sua área de especialização, que tem um método de ensino e uma didática exemplar e eficiente e que ministra em uma universidade de renome; a forma que a sociedade valora este profissional, seu reconhecimento e salário, provavelmente será maior em relação a um professor que não possui tantas qualificações, dado que o primeiro professor, na margem, é mais “útil”, como muito bem mostra Carl Menger, em sua Teoria do Valor Subjetivo.
Seguindo a mesma regra e dentro de um livre mercado justo ou de um mercado menos regulado do ensino, se, por exemplo, um professor com um histórico ruim de acusações de doutrinação ideológica em um ambiente escolar, do qual este tipo de doutrinação não era aceito, entrar no mercado docente para competir uma vaga em uma universidade contra um outro professor que não possui um histórico ruim, as chances do primeiro professor perder a vaga por suas condutas passadas e que não se aplicavam nas regras da instituição e nem com o fazer docente, será enorme, enquanto a do outro docente, não.
Então, surge novamente a pergunta: diante de toda essa problemática criada por ideias opostas e por terem conhecimento de como funciona a questão do valor de seu serviço no mercado: qual o papel dos professores liberais e libertários dentro do ambiente escolar?
Há uma simples resposta para o papel e a atuação destes professores, que é: não fazerem um papel de docentes ativistas como acontece com alguns professores com ideologias de esquerda, e sim atuarem como sendo verdadeiros profissionais do ensino. Apesar do benefício social e da importância que um docente oferece, como foi demonstrado no começo do texto, ser um ainda é uma profissão e possui seus ônus e bônus como qualquer uma outra – e tratar esta profissão desta maneira não é desmerecê-la ou rebaixá-la, fazer isto é respeitá-la e lidar com seus problemas profissionais de maneira igualitária, igualmente como acontece em qualquer outro tipo de profissão (ou pelo menos como deveria ser), sem a intervenção de terceiros para dar ou não privilégios e beneficiar uma ou outra classe por motivos completamente avessos ao direcionamento do mercado.
Professores liberais e libertários, para além de suas ideologias e diferentemente de outros exemplos de professores ruins e mal-intencionados, devem atuar de maneira que não se comprometa a ética docente em sua atuação – por terem o conhecimento de professores que corrompem esta ética – e devem sempre realizar um papel eficiente e com inovações no âmbito do ensino – por saberem minimamente como funciona o valor de suas profissões e como o mercado pode ou não funcionar, para que ele possa mudar sua postura como docente, adotar novos métodos de ensino e atualizar sua didática para que sua carreira continue de maneira plena ou, até mesmo, dependendo de sua vontade e possibilidades futuras, fazer com que ela seja cada vez mais valorizada no mercado, criando novas oportunidades de crescimento.
O combate no meio acadêmico envolve ideias, e qualquer professor com qualquer uma outra ideologia pode, caso queira, tentar combater estas ideias com as que ele mais acreditar serem as melhores, porém sem envolver de maneira direta e obrigatória os alunos, os utilizando como objetos e não como sujeitos e indivíduos.
Alexsander Abade é coordenador local do Students For Liberty Brasil.
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