Gianluca Lorenzon: “as pessoas não acreditavam que existia uma direta relação entre socialismo e a destruição humanitária de uma sociedade”

Gianluca Lorenzon: “as pessoas não acreditavam que existia uma direta relação entre socialismo e a destruição humanitária de uma sociedade”

Luan Sperandio | 25 de maio, 2017

Gianluca Lorenzon é um dos jovens mais proeminentes do movimento libertário brasileiro. Graduado em direito pela Universidade Federal de Santa Maria, é especialista em Competitividade Global pela Georgetown University. Foi Diretor Geral de Operações do Instituto Mises Brasil e atualmente é consultor do mercado empresarial. Nesta entrevista ele fala sobre seu primeiro livro, recém lançado, “Ciclos Fatais: socialismo e direitos humanos“.

SFLB: Você ainda estava na graduação quando começou a esboçar a teoria dos ciclos humanitários. Como foi a origem deste trabalho?

Gianluca Lorenzon: Eu havia acabado de apresentar uma extensa pesquisa em direitos humanos para uma entidade internacional no começo de 2013, e estava absolutamente fascinado com o tema, tendo recém me tornado um liberal. Ao me envolver em discussões e eventos, acabei notando o quanto as pessoas não acreditavam que existia uma direta relação entre socialismo e a destruição humanitária de uma sociedade. Foi então que resolvi abrir e me aprofundar nesse tema.

SFLB: Qual a relação entre a teoria do ciclo de intervenção de Ikeda com a teoria dos ciclos humanitários?

GL: Tanto a teoria de Stanford Ikeda, quanto a minha, e a Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicas (TACE) também, lidam com problemas cíclicos de intervenção governamental. A de Ikeda, pode-se dizer, é a mais geral, porque compreende qualquer tipo de intervenção, e analisa os ciclos como pressupostos de incentivos que acaba gerando que levam ao aprofundamento das intervenções econômicas em geral. Mais ou menos como o “efeito heroína” da injeção de crédito na TACE. Mas esta se aprofunda mais em entender o boom e bust por interferência na moeda. Já a minha teoria lida especificamente com uma intervenção específica que gera ciclos humanitários. As três tem semelhanças e diferenças fundamentais. Obviamente, partindo da metodologia austríaca, eu acabei usando muito ambas as predecessoras para explicar alguns fenômenos particulares do ciclo.

SFLB: Enquanto o PT ainda dominava o Palácio do Planalto era comum o discurso de que o Brasil poderia virar uma Argentina ou uma Venezuela. Esse discurso era exagerado ou tinha uma razão de ser?

GL: Acredito que já tenhamos adquirido conhecimento o suficiente pra não termos virado uma Argentina ou Venezuela. Gosto de usar o exemplo do controle de preços. Os brasileiros já aprenderam com o governo Sarney que isso não funciona. Logo, acredito que não seria mais popular tal uso, ao contrário da situação naqueles países. Mas como tenho insistido, os aspectos econômicos são mais relevantes do que os culturais hoje para o desenvolvimento humano. Não há dúvidas que a Argentina historicamente tinha uma cultura muito mais “sofisticada” do que seus vizinhos, mas isso não impediu que caísse nos exatos mesmos planos e modelos econômicos que os demais.

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SFLB: Na obra você aponta que os direitos sociais tem sua eficácia restrita aos recursos materiais, que no direito administrativo se dá como o princípio da reserva do possível. Apesar disso, o ensino jurídico brasileiro costuma se preocupar muito com princípios e ideias e em nada com os efeitos jurídicos que elas podem provocar, até mesmo contraditórios. Por que isso acontece?

GL: Porque não existe relação no nosso ordenamento entre regra e realidade. Ele vem de cima para baixo. Ou seja, é feita a lei e então as pessoas devem seguir. Na common law a lei, que vem das sentenças judiciais, já são adequadas à realidade, e só então afetam os demais como uma regra geral. Logo, nosso ordenamento não possui incentivos para que seja realista ou sequer consciente da realidade.

Geanluca Lorenzon autografa livros ciclos fatais socialismo e direitos humanos

Gianluca Lorenzon autografa exemplares do “Ciclos Fatais: socialismo e direitos humanos”

SFLB: Qual o paradoxo dos países escandinavos?

GL: É um aparente paradoxo. Eles possuem grandes intervenções governamentais em setores específicos sem que isso gere escassez e, consequentemente, um mercado paralelo para corrigir a coordenação. Isso se conecta diretamente ao “paradoxo de Mises”, que é respondido resumidamente na ideia de que uma sociedade com recursos suficientes (reserve fund) pode optar por um modelo menos eficiente e mais caro para alguns setores. Isso dura somente enquanto houver reserve fund, e que naqueles países já está se esgotando (vide reformas) que estão ocorrendo.

SFLB: Você deixou recentemente a diretoria de operações do Instituto Mises Brasil. Qual legado você deixa para o Instituto?

GL: Quando cheguei ao Instituto em maio de 2015 eu era o único locado dentro do escritório. Rapidamente reestabelecemos a livraria online e desenvolvemos um sonho de estratégia em longo prazo, que foi apresentado na Première, em Agosto de 2015 ainda. A partir daquilo foi desenvolvido todas as demais ações do Instituto, incluindo a Pós-Graduação, Summer School, Curso de Extensão, Treinamento para Gestoras de Investimentos, etc.

SFLB: Qual será a temática do próximo livro?

GL: Será um manual de como escrever notas de esclarecimento para escândalos do movimento liberal brasileiro. Brincadeira (risos). Estou com dois projetos em aberto, um aprofundando a relação entre Escola Austríaca, direito e “microeconomia”; e um que tenta analisar o intervencionismo em um aspecto mais rotineiro e contemporâneo. Mas nada para agora, preciso mededicar ao início da minha carreira no setor privado.

SFLB: Por fim, como enxerga o movimento libertário no Brasil em 10 anos?
GL: Acredito que terá se fragmentado demais, e que o que chamaremos de movimento libertário será algo bem mais restrito e delimitável do que hoje, pois o tempo vai filtrando se as pessoas realmente são libertárias ou se concordam somente de forma parcial com as ideias, destoando então para outros enquadramentos mais cabíveis no espectro que tende a se abrir no próximo ano.


Esta entrevista não necessariamente representa a opinião do Students For Liberty Brasil (SFLB). O SFLB tem o compromisso de ampliar as discussões sobre a liberdade, representando uma miríade de opiniões. Se você é um estudante interessado em apresentar sua perspectiva neste blog, envie um email para [email protected].

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